Thursday, April 06, 2006

Intra Viagens


Apanhei o eléctrico em direcção à Graça numa tarde preguiçosa de domingo. Sentei-me no último banco e reparei que há minha volta só havia turistas bem dispostos muito atentos e curiosos ao que se passava lá fora, absorvidos pela realidade que ia passando lentamente ao ritmo das travagens e paragens do eléctrico.
Notava-se que todos estavam deliciados com o que viam, desenhavam-se grandes sorrisos e ouviam-se comentários ditos a meia voz. As ruas eram estreitas, densamente povoadas de um lado e de outro por pequenas casas velhas, descoloridas e rasteiras. Na calçada viam-se pessoas vagarosas que se arrastavam sem destino ou então velhas senhoras debruçadas sobre o parapeito vendo quem passava.
Saí antes da última paragem, preferia seguir a pé, sentir o vento levezinho de Primavera, os cheiros, os ruídos. Os turistas lá continuaram, sorridentes, de máquina fotográfica em punho. Comecei a subir a calçada reparando nos pequenos cafés pouco iluminados e barulhentos, nas pequenas casas de portas de madeira trabalhada, nas janelas, ainda do tempo em que não se usavam estores, nas pequenas casas museu que mostravam as tradições portuguesas como os bordados, as rendas, as louças. A cada passo que dava sentia-me a rejuvenescer e sorria para mim e para os outros. Aquele ambiente tão aberto e revigorante fez-me esquecer que estava em Lisboa, na grande cidade impessoal.
Continuei a subir até que cheguei ao largo da Graça, era lá que ficava a livraria Pequeno Herói, o antigo botequim de Natália Correia, o objectivo final das minhas deambulações. O espaço é exíguo mas está muito bem conservado, pintado de amarelo suave seduzia imediatamente aqueles que para lá olhavam. Decidi entrar e vi uma pequena sala repleta de estantes cheias e um pequeno balcão que se encontrava vazio. Ao fundo uma rapariga contava histórias de encantar, sentei-me no chão, estava cansada de caminhar, e enquanto ouvia a voz doce da declamadora deixei-me levar pala magia do faz de conta, como se fosse a criança pequena que estava ao meu lado, de olhos grandes e boca aberta, deixando escorregar pelo queixo pingos de saliva.

1 comment:

Anonymous said...

conseguiste apanhar de maneira tão picturesca a beleza da graça, uma descrição perfeita do local. quem me dera viver ali. bj